terça-feira, 29 de novembro de 2011

HARRY POTTER e o Cálice de Fogo

 
Autor: J. K. Rowling

Título original: Harry Potter and the Goblet of Fire

 
Depois de três livros em que Rowling nos mostra uma criatividade de louvar e nos deixa completamente viciados, chega-nos este quarto livro e dá-se um salto qualitativo na saga, principalmente porque fica para trás a ideia de que HP é para crianças. Agora a história amadureceu, torna-se adulta e fala-nos de outros temas, muito menos infantis.

Sendo um livro muito maior do que os outros (quase o dobro), Rowling ganha com este livro o Hugo Award, o único ganho pela saga HP, e desde cedo percebemos que a história continua a evoluir tal como os leitores que a seguem.
É um livro que começa em grande, tanto pelo capítulo na casa Riddle, como depois na Taça do Mundo de Quiddicth, deixando qualquer leitor empolgado e tal como o próprio Harry, também nós esquecemos as preocupações sobre o que será o futuro. Logo de seguida o torneio dos Três Feiticeiros! Rowling junta magia, torneios, criaturas mágicas, provas dificílimas, pistas que nos deixam a ler a uma velocidade louca… tudo junto? O mais viciante Harry Potter até então!
Mas desenganem-se aqueles que possam achar que este livro é apenas um Torneio. Desde cedo se percebe ligeiramente que agora tudo é mais negro, nós apenas estamos mais interessados no resto! Rowling uma vez mais faz-nos olhar para um lado enquanto no outro é que está o que realmente será importante. A autora mostra ainda mais o seu mundo mágico, muito graças às duas escolas que passamos a conhecer melhor e ainda às intrigas/interesses políticos que se começam a formar. Uma novidade na saga!
De resto Rowling não desilude. Começam-se a sentir os primeiros enredos amorosos; temos a introdução do Pensatório que oferece mais qualidade ao enredo; novas personagens distintas, sendo que algumas conseguimos mesmo odiar, como a Rita Skeeter (grande qualidade por parte de Rowling); temos as aulas de Alastor Moody, excelentes e que nos preparam para o salto de amadurecimento que antes mencionei; entre outros enredos secundários que passaram por Hermione a tentar “salvar” elfos, antigos Devoradores da Morte, etc...
Devo ainda salientar que uma vez mais Rowling consegue reproduzir bastante bem as mentes dos adolescentes, e tal nota-se principalmente nas três personagens principais, nas suas discussões, reacções e nos seus momentos de alegria, mas uma vez mais percebemos lentamente que antes tínhamos mais momentos em que nos riamos, e agora ficamos apreensivos.
Rowling consegue com este livro prender qualquer leitor que ainda não fosse viciado nos três anteriores (também não deveriam ser muitos). Um livro que se lê de seguida, o elevar da qualidade em quase todos os parâmetros do livro, várias surpresas, e ainda uma mão cheia de pistas, dadas em cada página de forma brilhante, e que nós lemos, mas não vemos.
Os diálogos são fantásticos em algumas situações, e pelo menos uma vez roçam a perfeição, num dos capítulos do fim, onde muito acontece. Que grande capítulo, nem tanto pelo que acontece, mas pela forma como acontece e pela qualidade das palavras de uma certa personagem. Excelente!
Uma vez mais um livro imperdível. Quem comece a ler esta saga, tenha a idade que tiver, se quiser ter prazer a ler algo que o faça sentir bem, muito provavelmente não conseguirá parar de ler Harry Potter.

domingo, 27 de novembro de 2011

O EVANGELHO DO ENFORCADO


Autor: David Soares


Sinopse: Nuno Gonçalves, nascido com um dom quase sobrenatural para a pintura, desvia-se dos ensinamentos do mestre flamengo Jan Van Eyck quando perigosas obsessões tomam conta de si. Ao mesmo tempo, na sequência de uma cruzada falhada contra a cidade de Tânger, o Infante D. Henrique deixa para trás o seu irmão D. Fernando, um acto polémico que dividirá a nobreza e inspirará o regente D. Pedro a conceber uma obra única. E que melhor artista para a pintar que Nuno Gonçalves, estrela emergente no círculo artístico da corte? Mas o pintor louco tem outras intenções, e o quadro que sairá das suas mãos manchadas de sangue irá mudar o futuro de Portugal. Entretecendo História e fantasia, O Evangelho do Enforcado é um romance fantástico sobre a mais enigmática obra de arte portuguesa: os Painéis de São Vicente. É, também, um retrato pungente da cobiça pelo poder e da vida em Lisboa no final da Idade Média. Pleno de descrições vívidas como pinturas, torna-se numa viagem poderosa ao luminoso mundo da arte e aos tenebrosos abismos da alienação, servida por uma riquíssima galeria de personagens.


Com o livro Batalha a ser uma enorme surpresa pela sua qualidade (principalmente filosófica), li A Luz Miserável e confirmei o estilo de escrita de David Soares, a qualidade nas suas palavras. Agora faltava confirmar a capacidade de Soares em desenvolver boas historias... confirmado!
O livro Batalha tinha como grande trunfo o que nos transmitia, os diálogos e acções repletos de significado, as questões filosóficas que levantava. A Luz Miserável por seu lado mostrou-se como um livro de contos forte, com uma escrita que nos leva até ao momento singular em que o horror explode, e agradado com a leitura destes dois livros atirei-me a este “O Evangelho do Enforcado” e devo já dizer que Soares consegue com notável mestria, misturar ficção e História, algo que poucos conseguem fazer em Portugal.
Contando a história de Nuno Gonçalves, autor dos Painéis de São Vicente, vamos conhecendo esta personagem desde o seu nascimento até ao feito da sua enigmática obra, e se no início do livro não senti grande entusiasmo nestas páginas, foi sensivelmente a meio que comecei a agarrar-me à história que Soares criou. Com a sua escrita sempre forte, esta leitura mostrou-se mais rápida do que Batalha, sem todas as palavras quase desconhecidas da grande maioria dos leitores, mas devo assinalar que nunca faltou o significado de cada linha. Este é um dos grandes motivos pelos quais gosto deste autor: ele não escreve por escrever. Não escreve para vender ou para encher o livro. O que temos aqui é uma escrita cheia de significados, tanto nas detalhadas descrições como nos inteligentes diálogos, e se em Batalha éramos brindados com mensagens quase “educativas”, filosóficas; aqui vemos em cada linha a criação de personalidades, de movimentações de bastidores pelo poder do Reino e alimentar de medos. Tudo isto tendo como trunfo a força visual do que lemos enquanto somos brindados com os pensamentos das personagens, pensamentos esses que nos ajudam a perceber os motivos, principalmente de Nuno Gonçalves e do Infante D. Henrique, as duas grandes personagens deste livro e que o fazem avançar. E é com estes dois homens, personagens deveras cativantes, que avançamos nesta Lisboa que se viria a tornar no centro do mundo moderno.

O medo e a sede de poder são os grandes catalisadores da acção humana, levando-nos a praticar o impensável, a quebrar as barreiras da sanidade mental... este livro mostra-nos isso. Os jogos de poder estão muito bem encaixados nos factos históricos, e as personagens ganham qualidade com este facto, o que aliado a uma excelente investigação de Soares nos leva a “entrar” no mundo Medieval Português sem grande esforço. Lemos as suas superstições, essa crença que move uns, inspira outros e torna muitos ignorantes. O simbolismo também está presente, e novamente uma excelente investigação do autor, que nos dá uma escrita que não está presa a mitos históricos, a teorias ou a ideias populares que tentam definir personalidades de pessoas há muito mortas. Este não é um livro para nos contar a verdade, é um trabalho de ficção, que não serve para nos empolgar, para nos fazer sorrir ao sentirmos orgulho nos nossos antepassados... serve para pensar e muitas vezes chocar com o detalhe visual do autor. Resultado final: este livro tornou-se viciante e muito graças às duas personagens que antes mencionei. Nuno é uma personagem fascinante!

Biliões de pessoas já viveram e morreram. Caminharam este mundo, respiraram, sofreram, amaram, mas quantas atingiram a imortalidade? O que é realmente tornar-se imortal? Afinal o que vence a morte? Um acto? Uma criação? Pode um pintor imortalizar-se numa obra? Num bocado de madeira, numa tela... por vezes morremos, mas deixamos para trás algo que nem a própria morte consegue destruir.
No fim as últimas páginas são mais do que o terminar de uma história. São o pensar da mesma, dos seus significados, é a rampa para o que virá, com um encontro que eu não esperava... apenas mais um detalhe que nos mostra como David Soares mistura fantasia e realidade de forma magistral.

Olhando para o todo, este livro não tem para mim, a excelente qualidade de Batalha, mas é mesmo assim um bom livro, do melhor que já li do género. Do melhor que se faz no nosso país. Se gostam deste género literário, então este livro é mais do que recomendado! Se não gostarem de descrições fortes, tanto nas acções de algumas personagens como na visão que nos é dada de Lisboa enquanto sociedade, este livro pode não agradar a alguns leitores, mas tal como antes disse, Soares não escreveu este livro para vender, ele escreveu-o para ter qualidade e conseguiu-o! No top dos livros de Língua Portuguesa que li nos últimos anos, David Soares é realmente um dos grandes escritores do fantástico Português!
Deus é uma ideia.  Nada é tão ambíguo quanto uma ideia.

Aproveito ainda para realçar o texto escrito pelo autor nas páginas seguintes ao fim da história. Bastante interessantes, com o objectivo de explicar as motivações e a pesquisa do autor, e convidando-nos a lermos outras obras que tentam descobrir muitos dos factos que se misturam nesta história. Uma adição que ajuda a percebermos melhor onde está a linha que divide ficção e realidade.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

2001: ODISSEIA NO ESPAÇO

Autor : Arthur C. Clarke

Título original: 2001: A Space Odyssey

Sinopse: A Discovery movimenta-se no Espaço a 150 000 km/h. É o primeiro ano do século XXI. A sua missão deve-se à descoberta de um estranho monólito encontrado na cratera Clavius, na Lua. Trata-se de um cartão de visita deliberadamente enterrado há milhões de anos, por uma inteligência extraterrestre. É preciso encontrá-la. Seja onde for. Seja quem for. O romance dramático de um dos filmes mais espectaculares jamais produzido.


Arthur C. Clarke é um dos grandes nomes da Ficção-Científica e juntamente com Kubrick criaram ao mesmo tempo o famosíssimo filme e o livro que ainda hoje reúne fãs do género na tentativa de perceberem o que realmente acontece nesta história. Clarke chegou mesmo a dizer que o livro e filme deveriam ter sido assinados pelos dois, sem qualquer divisão de protagonismo, mas o que nunca disseram foi o verdadeiro significado do seu final.
Se o filme de Kubrick mostra uma componente mais visual da história, centrada por exemplo nas dificuldades do Homem em viajar no Espaço, o livro de Clarke é mais esclarecedor, mas não o suficiente. Confesso que falar sobre este livro será seguramente o maior desafio que alguma vez terei neste blog!
E porquê? Porque ninguém pode afirmar que percebeu realmente o que os autores queriam passar a quem vê o filme ou leia o livro. Kubrick disse várias vezes que cada pessoa será livre de pensar e especular sobre o significado filosófico e alegórico de 2001. Este é daqueles livros em que é bom sabermos durante a primeira leitura que devemos procurar as mensagens que por vezes são invisíveis. Temos de pensar nos significados da mais pequena linha, pois Clarke pode estar a dizer-nos algo. Isso nota-se tanto nas descrições de sensações, ambientes/cenários ou ainda nos diálogos de HAL com os astronautas.
O livro, superior ao filme na minha opinião, mostra-nos um pouco da evolução, desde um grupo de macacos que descobre um monólito na Terra até à descoberta de um outro monólito na Lua, enterrado há milhões de anos por extraterrestres, e digo isto porque no meu ponto de vista, o monólito é a chave da evolução da espécie neste livro, mas uma vez mais cada pessoa terá a sua própria interpretação. Neste primeiro aspecto, a evolução humana, este livro retracta-o como poucos, desde o macaco que não domina o seu ambiente, passando pelo Homem que domina o seu planeta… e depois temos, a meu ver, uma das mensagens desta obra. O Homem, ainda ingénuo e inexperiente, ao explorar o Universo volta ao papel anterior, ao do macaco que explorou a Terra. No Espaço o Homem não respira, não é mestre dos seus movimentos sem gravidade, não controla os seus objectos flutuantes, depende da tecnologia para viajar… há muitos factores que o Homem desconhece, e tal nota-se na sua ingenuidade para com o monólito e a forma como o aborda e estuda. A evolução traz a contrapartida, o Homem torna-se dependente do que cria.
A escrita de Clarke é fluida e nunca sentimos o ritmo a abrandar. Os diálogos são bons mas não marcam uma posição no livro (existem algumas excepções, muitos graças a HAL), pois o grande trunfo é a história, o mistério pelo desconhecido, e a capacidade do autor em descrever cenários do nosso Universo que nos fazem acreditar que estamos nesses longínquos planetas. No fim sentimos que este livro está longe de ser considerado desactualizado, pois as suas linhas dizem-nos que ainda falta descobrir muito, e tudo isto enquanto nos mostra criações do autor que fazem actualmente parte do nosso mundo.
Fica bem marcado como Clarke quis mostrar o quanto o Homem ainda tem a aprender. Viajar pelo Espaço é apenas o início, um pequeno passo e ainda há muito para conhecer neste Universo. Tudo isto que enumerei é facilmente compreendido quando um grupo de astronautas viaja até Saturno, mas tudo o resto fica à imaginação de cada um retirar o que este livro realmente nos tenta dizer. Cada pessoa terá uma explicação para o seu final. Talvez seja um final cheio de esperança, talvez seja a prova da existência de Deus, ou um novo passo na evolução Humana, um para o qual não estamos conscientes ainda.

Este é um livro sem grandes reviravoltas, sem grandes surpresas de intrigas ou enredos. Este livro não é para nos surpreender com personagens que não são o que parecem. É um livro que nos faz pensar, que deixa uma mensagem, uma visão do que nos rodeia para lá da nossa visão e compreensão. Um livro deve sempre passar algo a quem o lê e este dará certamente alguma coisa a cada pessoa, algo diferente. Talvez Clarke e Kubrick também tivessem ideias diferentes em relação ao que esta experiência significa.
Na minha opinião este livro é obrigatório para qualquer fã de Ficção-Científica, uma obra-prima, um livro realmente diferente, que não sendo dos meus favoritos, não posso retirar-lhe a enorme qualidade que tem. No entanto se nunca leram nada neste género, então leiam primeiro outro livro de Ficção-Científica, não comecem a vossa viagem na FC com este livro, devido a ser um livro tão singular. Mas que é obrigatório, é!

Fico à espera da vossa opinião sobre o que este livro representa e transmite!

domingo, 20 de novembro de 2011

HARRY POTTER e o Prisioneiro de Azkaban

Autor : J. K. Rowling

Título original: Harry Potter and the Prisoner of Azkaban


Este é o livro em que notamos a escrita de Rowling a amadurecer mais e mais, tornando este livro melhor do que os dois anteriores, com novas personagens e criaturas mais sombrias, temas mais fortes, tudo ajuda este livro a vincar ainda mais a qualidade da série. 
Certamente um dos mais adorados pelos leitores, este livro apresenta personagens que serão importantes para o futuro, juntamente com revelações do passado, artefactos que demonstram uma imaginação prodigiosa da autora e no fim grandes revelações que nos fazem sonhar com os próximos livros.
O mundo de Rowling continua a desenvolver-se, e percebemos que a imaginação da autora não irá parar de nos surpreender, criando novos cenários, costumes e personagens, tudo isto com uma escrita que nos deixa facilmente imaginar o que lemos, sem esforço. Este é certamente um dos segredos de Harry Potter. Adeus descrições enfadonhas e extensas! Aqui Rowling dá-nos o essencial com uma leveza que nos permite continuar a ler e ler sem cansar, mostrando que os livros anteriores não foram obra do acaso.
As personagens continuam a evoluir, cada vez as conhecemos melhor e às suas personalidades vincadas que nos dão a sensação que as conhecemos há anos e estará aqui outro dos segredos de Rowling!
Este livro, centrado na fuga de Sírius Black da prisão de Azkaban, torna-se imediatamente mais negro, mais maduro, e rapidamente percebemos que o futuro da série perderá aos poucos o ambiente mais infantil dos livros anteriores. Para tal muito ajuda a sensação de que Harry corre perigo desde o início do livro, algo que não se sentiu  na "Pedra Filosofal" nem na "Câmara dos Segredos", juntamente com a presença constante dos Dementors. Resultado, lê-mos o livro à velocidade da luz na busca de sabermos como irá o jovem feiticeiro salvar-se desde fiel servo de Voldemort, capaz de proezas incríveis no mundo da feitiçaria. 
Devo ainda falar de algumas introduções que adorei, como o Vira-Tempo e as excelentes criaturas Dementors, as minhas favoritas da saga, e ainda a personagem Lupin, o novo Professor em Hogwarts, que rapidamente se torna numa personagem com a qual nos preocupamos.
Quando li há muitos anos este livro pela primeira vez, acabei-o em dois dias, foi uma leitura tão fácil como viciante. Todas as outras vezes que o li tudo se manteve. A leitura sempre me prendeu, nunca sentindo a tentação de “ler na diagonal” por já ter lido antes, nunca sentindo a sensação de parar porque já sabia o que iria acontecer. O efeito Harry Potter permanece, cheio de magia, de momentos que nos fazem rir e de vontade por conhecer mais e mais deste mundo que aos poucos conquista o mundo literário. Rowling não demoraria muito a pôr o mundo a ler, algo que muitos poucos autores se podem dar ao luxo de dizer.
Um excelente livro, sem um único momento de desilusão, mesmo quando as expectativas eram tão altas. Já o li três vezes, e um dia voltarei a fazê-lo!Não há muito mais a dizer. Dentro de dias falarei do próximo, um livro simplesmente fantástico!

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

A BALADA DO CAFÉ TRISTE

Autor : Carson McCullers

Título original: The Ballad of the Sad Café


Sinopse: Numa pequena povoação no Sul profundo dos Estados Unidos, Carson McCullers dá-nos a conhecer um trio de personagens pouco convencional. Miss Amelia Evans foi casada durante dez dias com Marvin Macy, o homem mais bem-parecido mas com o caráter mais instável da povoação, e desde aí tem estado sozinha à frente do seu próprio destino. Até um dia chegar à terra um anão corcunda que se afirma seu primo, roubando-lhe o coração e transformando a sua loja num café cheio de vida. Mas quando o marido rejeitado regressa ao fim de vários anos, inicia-se um estranho triângulo amoroso - e a vida no café nunca mais voltará a ser a mesma…


É por esta razão que muitos preferem amar a ser amados. Quase toda a gente quer ser o amante. E a verdade nua e crua é esta: no íntimo, o facto de ser amado é intolerável para muita gente. O amado teme e odeia o amante, e pela melhor das razões. O amante quer sempre mais intensamente ao seu amado, e ainda que isso lhe cause somente dor.

Não conhecia esta autora antes de ler este livro, e como tal a surpresa foi enorme. Este pequeno livro com perto de 80 páginas foi uma experiência tão genuína que me faz perguntar como foi possível nunca ter ouvido falar desta autora. McCullers arrebata lentamente, quase embalando o leitor, com uma escrita leve, fácil e rápida, enquanto nos oferece descrições tão curtas mas incrivelmente tão precisas que conseguimos imaginar o local como se o estivéssemos a ver.
O que torna este livro realmente bom é o facto de a autora misturar tanta coisa e tudo parecer tão bem orquestrado. A base da história deverá, muito provavelmente, ser diferente para cada leitor. Uns poderão dizer que se trata de amor, de tristeza, de solidão. Eu acho que este livro é sobre as necessidades que cada pessoa tem e o quanto dói quando não as temos. Nós humanos só damos o real valor ao que não temos, e será sempre assim, por mais que tentemos lutar contra esse facto. É a busca pelo que não temos que nos move!
Todas as pessoas precisam de algo. Amelia precisa de redenção e o seu primo dá-lha. Marvin precisa de atenção, e nunca a recebe. E tudo nos remete para a solidão, tanto física como psicológica. E como este livro consegue de forma tão suave e simultaneamente tão dura mostrar o que realmente é a solidão, o quanto dói.
Quem viveu acompanhado teme ver-se abandonado. O silêncio de um quarto aquecido onde de repente o relógio para de trabalhar, as sombras de uma casa vazia… É melhor receber o pior inimigo do que enfrentar o terror da solidão.

Talvez a solidão nos mude. Talvez algumas pessoas façam tudo para não estarem sozinhas, talvez aguentem tudo, percam a própria identidade, a personalidade, para não perder a companhia.  É isto que este livro me mostrou a mim, três personagens longe do estereótipo que imaginamos, três pessoas tão frias e distantes e curiosamente que dependem tanto umas das outras. O amor pode, talvez até facilmente, mudar uma pessoa, tornando-a melhor… mas também pode piorar, e muito, pois não existe amor sem ódio. É isso que nos torna humanos, essa felicidade e sofrimentos que nos acompanham na nossa vida, alterando o nosso caminho e estas personagens enfrentam os seus caminhos de forma sempre surpreendente, movidos não pela personalidade, mas pelo que sentem!
E o problema reside nisto: todas as coisas têm um valor e é preciso dinheiro para as ter, pois é assim que o mundo funciona. Sabe-se quanto custa o fardo de algodão ou uma quarta de melaço. Mas a vida humana não tem preço: é-nos dada de graça e levam-na sem pagar nada. Quanto vale? A julgar pelo que nos rodeia, por vezes o seu valor é pouco ou nenhum. Muitas vezes esforçamo-nos sem descanso e as coisas não melhoram, e depois surge a sensação de que não se vale nada.

A escrita de Mccullers é assim, directa, tornando este livro numa experiência única, que se lê à velocidade da luz. É daquelas autoras que não precisa de muitas páginas para nos fazer perceber o essencial, nós só temos de ler, pensar e perceber, e é isso que um livro nos deve obrigar: a não nos limitarmos a ler! Devemos sentir e pensar, compreender ou então o livro nada nos ensinou. Neste caso 80 páginas chegaram para uma bela história e para nos fazer pensar. Uma leitura rápida, um livro barato. Uma qualidade que não se pode negar. É um excelente livro!

sábado, 12 de novembro de 2011

Os Anos de Ouro da PULP FICTION Portuguesa

Autor : Vários autores

Organização e Introduções de Luís Filipe Silva


Um livro, treze contos:

O Segundo Sol
A Expedição dos mortos
A Ilha
Pena de Papagaio
O Sentinela e o Mistério da Aldeia dos Pescadores
Horror em Sangue de Cristo
O Inconsciente
A Noite do Sexo Fraco
Pirata por um dia
Valente
                                                               O Amaldiçoado de Ish-Tar
                                                              Noites Brancas
                                                              Mais do Mesmo!

Lançar um livro de contos na mesma altura em que é publicado o último livro de Saramago e de José Rodrigues dos Santos é um factor mais do que suficiente para a maioria das pessoas não olharem para este livro. Mas a realidade é que este livro deve ser olhado com atenção e eu aconselho. Sendo eu um apreciador da Pulp Fiction americana que marcou tantas gerações, fiquei espantado quando vi este livro no site da editora, principalmente por nunca ter ponderado que houvesse muito a dizer sobre este assunto.
Confesso que sou um ignorante em relação ao que se fez de Pulp Fiction em Portugal, e como tal nunca poderei argumentar com o que a capa do livro anuncia: os melhores contos do séc. XX, mas também não é essa a questão essencial. O que é importante para quem lê, e tal como eu não conhece, é que estes contos são realmente bons, acabando com a ideia que tinha de não existir grande qualidade neste género em Portugal.
Falando resumidamente da estrutura do livro, temos treze contos independentes, de autores distintos. Antes de cada conto, Luís Filipe Silva dá-nos uma introdução falando um pouco do autor explicando o seu percurso, quer na vida privada quer profissional. Estas introduções, que a princípio podem parecer algo aborrecidas, acabam por ser bastante esclarecedoras e no fim percebemos que existiu, não só uma enorme dificuldade em ter êxito ao início, mas também  uma variedade de acontecimentos, motivadas pelos mais variados interesses (desde dinheiro ou espionagem) que ajudaram no desenvolvimento deste género literário e também à sua destruição no nosso país. Agora com o livro acabado digo-vos que há várias perguntas sobre estes autores que gostaria de saber a resposta. Certamente muito se perdeu na História deste país, muito sem grande interesse, mas aqui permanece a sensação que este livro ganha claramente com estes textos introdutórios. De louvar o trabalho de organização e pesquisa necessários para se criar um livro que certamente não dará à partida grande garantia de vendas.

Em relação aos contos, este livro mostra-nos um Portugal alternativo, todos eles com temáticas diferentes, abrangendo os gostos da maioria dos leitores, e como tal, não existindo um conto que seja verdadeiramente uma obra-prima, a verdade é que enquanto conjunto, estes contos funcionam na perfeição. Temos histórias de cowboys, expedições ao estilo de Indiana Jones, piratas, contos de terror, espionagem, um conto de pura ficção-científica, entre outros.
Sendo contos rápidos, sem grandes descrições, conhecimento profundo das personagens e com uma escrita acessível, basta-nos absorver toda a acção disponível e lermos todas as surpresas e reviravoltas presentes em cada texto.
Claro que houve textos que gostei mais do que outros. Dos treze há dois que não me agradaram significativamente (apesar de notar a sua qualidade dentro do género), mas também há três textos que adorei de uma forma que não esperava: A Ilha (onde temos uma visão da Ilha da Madeira que me deixou de boca aberta), Noites Brancas (sinceramente dos melhores contos de Terror que alguma vez li) e Mais do Mesmo! (um conto de João Barreiros, o único com uma escrita mais descritiva, mais lenta, mas com um resultado final impressionante e que não fica atrás de grandes livros de Ficção-Científica de um grande autor internacional), o melhor conto deste livro. Mas todos eles têm algo em comum, são viciantes, directos à intriga que move a história, e conseguem sem dúvida alcançar o objectivo dos contos: divertir.
As particularidades são muitas, o conto O Inconsciente é de uma qualidade fora do comum, apesar de ter um final algo previsível; O Amaldiçoado de Ish-Tar é viciante do início ao fim e tive de o ler de uma só vez, e por fim o conto A Noite do Sexo Fraco que apresenta uma característica única: trata-se da versão integral do conto, ainda censurada/riscada pelo lápis azul da censura. Um detalhe que torna este livro ainda melhor (também graças à ajuda dos comentários de rodapé explicando o porquê da mesma censura)!  

Resumindo, muitas pessoas não apreciam contos porque nunca chegam a conhecer as personagens verdadeiramente, e porque quando começam a sentir uma proximidade com as mesmas, o conto acaba. Este livro não foge a essa regra, a verdade é que não há tempo/páginas para conhecer verdadeiramente uma personagem, o seu passado, traumas, gostos, ou para imaginarmos locais belos e bem construídos. Não, este livro é um conjunto de contos de ritmo acelerado, merecedores de estarem nesta colecção. É um trabalho de louvar de Luís Filipe Silva por nos dar a conhecer um pouco mais daquilo que a História apagou, dando-nos a hipótese de ler algo que possivelmente nunca conseguiríamos alcançar de outra forma, a menos que fizéssemos o mesmo trabalho de investigação.
Não se trata de ser um grande livro que nos marque como outros, com um enredo fabuloso, não é! Trata-se  de um livro de contos, de uma obra de coleccionador, com um valor que será inestimável para quem queira saber um pouco mais da própria história da literatura portuguesa, ter algo inédito nas suas prateleiras. Mais do que a qualidade, é o valor que este livro tem que realmente conta.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

HARRY POTTER e a Câmara dos Segredos

Autor :J. K. Rowling

Título original: Harry Potter and the Chamber of Secrets


Após o enorme fascínio em relação ao primeiro livro, agarrei este segundo no dia seguinte. Li-o tão depressa quanto os meus olhos me deixaram e não fiquei desapontado. Tendo lido toda a saga enquanto era publicada e já tendo relido cada livro pelo menos mais umas duas vezes, posso assegurar-vos que este é dos que gostei menos, mas mesmo assim, simplesmente adorei-o!
Quando acabamos o primeiro livro sentimos que Rowling criou um mundo adorável, sólido e que terá levado anos a ser construído na sua mente, e olhamos para este segundo livro com as dúvidas sobre até onde poderia chegar a sua imaginação. Pensando um pouco agora, quantas pessoas não terão achado que Rowling não teria capacidade para mais? Muitas certamente, eu incluído. Mas Rowling surpreende, desenvolvendo ainda mais o seu mundo, criando lugares mágicos, como A Toca e até a Floresta de Hogwarts, com descrições fantásticas, uma escrita fácil e uma criatividade de admirar. Muito dificilmente um adolescente não desejaria viver neste mundo.
Achando que no global não é um livro tão genial quanto o primeiro, continua a ser muito bom, e em muito ajudam os momentos hilariantes mas também a sensação de o livro ser mais maduro que o anterior, sensação que se manterá a cada livro da série. 
Rowling prova ainda que detém a capacidade de criar personagens distintas, sendo o nosso professor de Hogwarts prova disso, e mesmo que não gostemos do novo personagem, a verdade é que apresenta qualidade, tal como Dobby, personagem que será muito importante no futuro. Os momentos de Dobby neste livro são fantásticos!
Tal como Harry Potter, também se nota uma evolução nas outras personagens e este livro consegue centrar-se menos no jovem feiticeiro e dar alguma visibilidade aos seus amigos, principalmente a Hermione. Tal facto de menor centralidade, ajuda o livro a não ter uma acção única, existindo outros “mini-enredos” que ajudam o livro a avançar.
De realçar ainda que Dumbledore continua em grande, cada vez melhor e Rowling consegue criar uma mística em volta deste feiticeiro que nos faz sonhar. Por outro lado temos de assinalar que ficarmos a conhecer um pouco mais sobre Tom Riddle é um dos grandes momentos deste livro, certamente dos acontecimentos mais importantes, tanto para este livro como para o futuro.
No entanto alguns leitores mais cépticos poderão olhar para este livro e perceber que “cronologicamente” muito se repete: começamos o ano lectivo "calmos", mas rapidamente percebemos que algo está mal.  A adrenalina começa a subir, os acontecimentos cada vez mais perigosos e no fim do ano tudo acontece.
É um pequeno pormenor que penso nada retirar ao livro em qualidade, e não retira simplesmente porque os desenvolvimentos são bem estruturados, nunca se sentindo que a autora nos empurra deliberadamente para uma situação sem saber como.
Resumindo, uma série imperdível, viciante. Um excelente livro para quem gosta de ler com um sorriso nos lábios. Ah, ainda tempo para uma coisa: na minha opinião a adaptação ao cinema continua desastrosa. Demasiado diferente em pormenores importantes, perde toda a magia e por isso digo-vos: leiam os livros!

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

A LARANJA MECÂNICA

Autor: Anthony Burgess

Título original: Clockwork Orange


A Laranja Mecânica de Anthony Burgess é considerado um dos grandes livros de Ficção-Científica, principalmente pelas inúmeras questões que levanta e também pelas várias ideias que introduz ao género.
Este livro, narrado pelo jovem Alex, traz-nos um mundo violento, uma Londres onde os gangs de adolescentes dominam com os seus actos de “ultra-violência”, roubos, violações, etc… e tal violência é bem sustentada pelo mundo criado, nunca parecendo exagerada. Desde o início percebemos que o narrador nos fala numa linguagem estranha, um "calão" inventado pelo autor e que ao início nos obriga a uma leitura lenta e consecutivas viagens ao glossário para vermos o que significam certas palavras que os adolescentes usam.  Uma aprendizagem rápida. Neste aspecto o livro é simplesmente brilhante e digo-vos que quase parece estranho como uma narração tão cheia de “calão” consegue ser tão bela e bem escrita, levando-nos a entrar na história facilmente e a odiar este narrador adolescente, líder de um gang que aterroriza as pessoas.
Mas é quando um assalto corre mal e Alex é preso, que este livro ganha a dimensão que hoje lhe damos. Cobaia de uma experiência do governo, Alex vê-se incapacitado de praticar o mal, mesmo que o deseje., algo que para esta personagem se assemelha à incapacidade de viver. E é aqui que as questões deste livro se levantam!
Onde está o valor moral de uma pessoa? O que faz uma pessoa boa ou má? As suas acções ou  a sua vontade? Poderá um cidadão normal ser considerada pior cidadão do que um homem que apenas pode fazer o bem mesmo que verdadeiramente deseje praticar o mal?
A grande maioria das religiões, acreditemos ou não, dizem-nos que algo ou alguém nos criou com a capacidade de escolha, decidir as nossas acções, pois todos conseguimos distinguir o bem do mal. Este livro tira-nos essa escolha. Alex perde a sua identidade, a liberdade de ser quem realmente é. E se inegavelmente se trata de uma transformação benéfica para a sociedade, qual é o limite moral para o que se pode fazer à mente de uma pessoa? será tudo uma questão de "bem maior" ou de liberdade?
Mas afinal o que é a liberdade? Deverá o interesse social estar acima da liberdade de uma pessoa que talvez nem a mereça? Deverá ser dada, em última instância, a decisão ao prisioneiro? Escolher entre a liberdade da sua pessoa dentro de uma prisão ou a vida fora da prisão mas sem a liberdade de escolha que sempre foi um dado adquirido a qualquer ser vivo?
Alex passa de agressor e violador a uma pessoa que apenas pratica o bem. Mas será ele uma boa pessoa?  Será ele uma pessoa sequer? Cada leitor terá a sua resposta.
Para quem já viu o filme, Kubrick faz uma adaptação brilhante, e se no global o livro é superior, por apresentar muito mais detalhe deste mundo criado e do próprio narrador, a verdade é que o final no filme agradou-me muito mais do que o fim do livro, mas será uma opinião que varia de pessoa para pessoa, principalmente pela forma como olhamos para o narrador.
A Laranja Mecânica é um excelente livro, a sua qualidade inegável. Pessoalmente não foi um livro que me tenha dado um prazer enorme a ler, também nunca foi maçador, mas é um livro obrigatório aos fãs do género, pelas questões antes mencionadas. A personagem principal, totalmente maléfica, ajuda o leitor a entrar na história e a ficar dividido na última metade do livro, quase que partilhamos a sensação de que algo de mal irá acontecer a qualquer momento e tememos por isso.

No fim perguntamos, o que é mais importante? Um homem normal que escolhe praticar o bem e o mal, ou um homem que não tem como opção praticar o mal? Alguém tem a resposta?