Autor: William Shakespeare
Esta será, talvez, a mais difícil opinião que algum dia escreverei. Se retirarmos da "lista" os livros religiosos, então Hamlet é o livro mais estudado da nossa história, com centenas de interpretações, e sabe-se lá qual está mais próxima do que o autor queria transmitir na sua peça. Alguns críticos dizem que ao interpretarmos Hamlet, nos estamos a ver a nós mesmos, um espelho que nos demonstra o que queremos ver ou quem somos. Eu, enquanto simples leitor que tenta escrever sobre este livro, não tenho competência para argumentar sobre isso, mas, tal como muitos dizem, também eu acredito que Hamlet é, provavelmente, a personagem mais fascinante que alguma vez li.
Duvida que as estrelas sejam fogo, duvida que o sol se mova. Suspeita que a verdade minta. Só não duvides nunca do meu amor.
A história de vingança é universal (O Rei Leão foi baseado nesta obra) e não é, por si só, fascinante. O que marca o livro e o leitor, ao ponto de ainda hoje se estudarem estas páginas, é Hamlet. Este homem demonstra-nos o que é o livro, qual o seu tema. Para mim, esta obra é sobre a morte, a nossa reação à mesma e a dúvida de não sabermos o que existe depois do momento em que morremos. E é aí que entra uma das grandes frases de Hamlet.
Ser ou não ser... eis a questão.
Afinal o que existe durante o "não ser"? Qual dessas fases, ser ou não ser, é a melhor? Para mim, esta é a base da história: a dúvida de Hamlet, presente a cada instante após falar com o fantasma do seu pai. Tal, nota-se nas suas dúvidas, sobre se deve ou não vingar-se, e quando o deve fazer. Nós somos o único ser que tem a perfeita noção de que vai morrer. Animais têm o instinto de sobrevivência mas não sabem (ou pelo menos é o que achamos) que depois existe o "nada". Deus (quer exista ou não), também não tem noção do nada que chegará, pois Deus não morre. E assim, nós, humanos, sabemos que um dia tudo acabará, pelo menos neste mundo. E toda a nossa vida, cada instante, é condicionado por sabermos que um dia, iremos desaparecer, provavelmente sem fazermos tudo o que desejamos, sem dizermos o que queremos, sem nos despedirmos de quem amamos. E para mim, é isto que enlouquece Hamlet: é a inevitabilidade da morte e a justiça desta vida. O momento, talvez o mais marcante do livro, em que Hamlet fala com a caveira do Bobo, é a prova disso:
(Hamlet a falar para a caveira): Vai procurar a minha senhora e diz-lhe que, por mais pintura que ponha no rosto, é a este estado que tem de chegar.
Hamlet não tem nada de herói. É inteligente, é justo, mas a loucura abate-se sobre todos os homens em algum momento, e Hamlet não é exceção. A forma como trata Ofélia e também a sua mãe, são temas há muitos discutidos, e eu, enquanto leitor, também retiro as minhas conclusões. Mas num texto tão singular, é para mim impossível, perceber qual a verdadeira intenção de Shakespeare.E é essa a sua genialidade.
Existem outras personagens interessantes, importantes, mas nenhuma marca como o Príncipe. A leitura não é fácil devido à prosa do autor, e exigiu-me alguma concentração para retirar alguns significados. Sendo uma peça de teatro, toda a narrativa descritiva está praticamente ausente, ficando apenas os diálogos e as ações mais importantes. Este é um livro de narrativa complexa, da qual não é fácil retirar todos os seus significados. O leitor deve ter paciência e questionar. Se o fizer, ficará fascinado pela luta interior de Hamlet, e, provavelmente, tirará conclusões diferentes das minhas, que não irei aqui revelar. Hamlet é um verdadeiro clássico, uma obra imortal que continuará a ser discutida durante muitos anos. Não é para o gosto de todos, mas é muito bom!
Luís Pinto