sábado, 31 de dezembro de 2016

SILÊNCIO


Hoje apresento mais uma opinião da leitora Margarida Contreiras que por várias me enviou excelentes opiniões a livros que não tive oportunidade de ler. Obrigado à Margarida por mais este excelente texto!



Autor: Shusaku Endo


Sinopse: Silêncio, cuja acção decorre no século XVII, conta-nos a história de um missionário português envolvido na aventura espiritual da conversão dos povos orientais, o qual acaba por apostatar, após ter sido sujeito às mais abomináveis pressões das autoridades japonesas, para evitar que um grupo de fiéis seja por ordem delas torturado até à morte. 
Antes de chegar ao Japão, a sua viagem leva-o a Goa, depois a Macau e, finalmente, a Nagasáqui e Edo, em etapas que pouco a pouco o transportam a esse Oriente hostil, onde no entanto já se contam alguns milhares de convertidos à fé católica. 
Aí descobre, na luta contra as pessoas e o ambiente adversos, a verdadeira fé, liberta de todo o aparato externo, eclesiástico ou mundano. E aí acaba por experimentar a derradeira solidão, que é o destino daqueles que quebram a comunhão com o que mais profundamente marca a sua identidade.



Aqui conta-se a história de dois jesuítas portugueses que se aventuraram numa desditosa odisseia ao Japão seiscentista. Um deles é o padre Sebastião Rodrigues, que embarcou em busca de cristãos oprimidos para reaproximá-los da imagem de Cristo e dar-lhes algum conforto espiritual. Estamos então na época de um imperador japonês que invertera a política do seu antecessor através da abolição absoluta da religião cristã. Os cristãos japoneses, forçados à apostasia, viviam apavorados com a ideia de serem apanhados na ritualística e torturados caso recusassem blasfemar a Virgem Maria ou pisar os famosos fumies - imagens de Cristo fabricadas com o propósito de serem pisadas pelos apóstatas. 

O livro começa com um prólogo em que o autor nos fala na primeira pessoa  e nos revela a sua própria questão existencial e a sua inquietação espiritual, cuja leitura é essencial a quem procura compreender que profundidade atinge esta história. Com efeito, um dos fatores mais interessantes deste livro é a nacionalidade japonesa do seu autor que nos traz uma novidade no âmbito da ficção histórica existente acerca da Era dos Descobrimentos portugueses: a colisão intercultural vista pelos olhos do povo de além-mar. 

Seguidamente, surge uma compilação de cartas que Sebastião envia para Roma contando as peripécias da sua viagem. Esta é uma forma bastante apelativa de estruturar a narração, já que aproxima o leitor do acontecimento, permitindo-lhe um contacto direto e mais real com a personagem principal criando, ao mesmo tempo, um ambiente de suspense mais elevado, já que o próprio remetente se mostra expectante e receoso no final de cada carta.

Numa terceira e última parte, o discurso passa para o narrador, que apenas sabe o que está na cabeça de Sebastião e nos conta tudo através dos seus olhos. E assim rezamos com este jesuíta, vemos e revemos a sua própria imagem de Cristo, e buscamos com ele o sinal divino da salvação das almas torturadas. Inclusivamente, vivemos com ele o tédio do cárcere, desesperando com ele, mas sem nos entediarmos. Até que, finalmente, com ele respondemos também à mais dramática interrogação deste livro: apostasia ou martírio?

Shusaku Endo encarna nesta história a necessidade intemporal do Homem em recriar a imagem de Deus à sua própria imagem de humano, estando, afinal, a reproduzir um Deus que criou o homem à sua imagem e semelhança. É assim que o padre jesuíta constantemente procura conforto na expressão mais concreta do intangível - a vida de Cristo -, inspirando-se no seu rosto e na sua carne talhada para dar justificação e persistência ao seu sofrimento e tentar redimir Deus pela sua característica menos humana: a omnipresença invisível.

Um dos momentos mais interessantes do livro não é especificamente nenhum episódio da narrativa, mas o momento em que o leitor compreende na totalidade o título do livro, apercebendo-se de que o objetivo desta história é mostrar a dilaceração do coração de um homem que aspira seguir os passos de Cristo, acreditando que é esse o caminho para a salvação de todas as almas, incluindo a sua, e que Deus responde às suas preces desesperadas com um longo, doloroso e cerrado silêncio.

Não há muitos diálogos, até porque há muitos momentos de solidão, contudo, os poucos que lemos são bem estruturados e conseguem terrificar-nos ao constatarmos o poder manipulador da psicologia humana e os seus efeitos nefastos. O cenário compõe-se com poucas personagens, algumas representando claramente a fidelidade a Cristo e a devoção como força motriz da sua vida, enquanto outras representam a soberania japonesa de origens místicas bem diferentes. No meio, encontramos a figuração da cobardia em Kichijiro, da entrega à fé nos martirizados e a coragem nos que por entre eles se aventuram. Contudo, esta não é uma batalha entre o Bem e o Mal. É antes mais uma justificação para a necessidade da História em compor-se de grupos unânimes e a importância da religião para essa homogeneidade. Este livro não é um apelo, mas antes o testemunho de um recôndito subcapítulo do pós-epopeia dos Descobrimentos na sua versão missionária.

A dúvida instala-se implicitamente e vivemos o questionar de um sacerdote para com o seu próprio deus, sentindo-se abandonado por ele enquanto assiste à morte e à flagelação em seu nome. Chegamos, por fim, a um debate de sentimentos e ações sobre qual será o melhor sacrifício e qual a melhor maneira de servir um deus silencioso. Apercebemo-nos de que a fé está em cada um de nós de maneira diferente e, sobretudo, que ela é transparente e vive calada.




terça-feira, 20 de dezembro de 2016

STAR WARS - Darth Vader #2 - Sombras e segredos







Sinopse: Segundo volume da saga em BD protagonizada por DARTH VADER com argumento de Kieron Gillen e ilustrações de Salvador Larroca. Lançado pelo Imperador contra uma nova série de rivais que disputam a sua posição no Império, a raiva de VADER por terem duvidado da sua fidelidade é aumentada por uma revelação ainda mais chocante: o piloto que procura era na verdade o filho que nunca soubera que tinha




Mais um excelente livro. Depois de um primeiro livro muito bom, focado em Vader, este segundo livro continua no mesmo nível de qualidade. Agora Vader regressará às suas origens para perceber como foi possível não ter descoberto antes que tinha um filho, e com isso o enredo amadurece e aprofunda a complexa personalidade de Vader. Neste aspeto o livro está de parabéns, por explorar tão bem esta carismática personagens, mesmo que na maioria do tempo seja apenas de forma indireta, mas a cada gesto, a cada fala, sentimos que é a personalidade de Vader que está ali a ser mostrada ao leitor.

A história está bem conseguida e é inteligente, criando ambiente e dúvidas para os próximos volumes da saga. As questões que se levantam, tendo em conta que sabemos para onde o enredo se encaminha, ajuda a criar ligações entre os filmes e o nosso conhecimento aumenta. 

Este é mais um livro que expande o universo imaginado por George Lucas. A sua personagem mais famosa, Vader, tem aqui mais um grande momento que nenhum fã deve perder, deixando para segundo plano tudo o resto.

Com excelente qualidade do papel e da impressão, os desenhos destacam-se a cada instante, com o ambiente da saga, personagens facilmente reconhecidas e diálogos importantes. São várias as dúvidas que ficam no ar para os próximos livros, mas o que não existe é a dúvida sobre a qualidade deste livro. Vader tem aqui mais uma aventura à sua altura e que qualquer fã irá gostar. Recomendado!

Luís Pinto

segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

Passatempo: Os espiões do Papa - Vencedor


PASSATEMPO

Os espiões do Papa

Vencedor!



Chegou ao fim mais um passatempo de Natal, desta vez com a ajuda da Editorial Presença.

Oferecemos um livro que já analisei aqui no blog e que gostei bastante. A todos os que participaram e aos que tornaram este passatempo possível, muito obrigado.

A todos um Feliz Natal e fiquem atentos, porque há mais passatempos em breve!

Sinopse: A suposta impassividade do Vaticano perante as atrocidades dos nazis na Segunda Guerra Mundial continua a representar uma das maiores controvérsias da atualidade. A história apelidou Pio XII de «O Papa de Hitler» e considerou-o conivente com a política e ideologia nazi. Contudo, mais do que manter-se distanciado ou cúmplice dos acontecimentos ocorridos num dos períodos da história mais negros, o Papa teve um papel fundamental nos eventos que levaram à derrota nazi.
O historiador Mark Riebling, baseado em documentos recentemente abertos pelos arquivos secretos do Vaticano e pelo British Foreing Office, apresenta a versão que ao longo de décadas foi encoberta, abrindo as portas do Vaticano para revelar factos surpreendentes na história do pontificado.
Os Espiões do Papa lê-se como um romance policial baseado na figura do espião alemão Josef Müller, embora seja um relato histórico rigoroso. Mais uma obra magistral na coleção Biblioteca do Século, que vem contribuir para uma nova visão da história. 


 

E o vencedor é:  

Alexandra Nunes


sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

STAR WARS - Ajuste de contas na Lua dos Contrabandistas





Sinopse: Depois de descobrir o diário do velho mestre Jedi OBI-WAN KENOBI, Luke Skywalker parte para Nar Shadaa, a lua dos contrabandistas no seu caminho para tentar converter-se num Jedi. Segundo volume da saga STAR WARS em BD, uma série centrada nas personagens clássicas da saga: Luke Skywalker, Princesa Leia, Chewbacca, C-3PO, R2-D2 e restante Aliança Rebelde



Neste segundo livro da saga Skywalker, a qualidade continua bastante alta. Em primeiro lugar, parabéns à editora Planeta por continuar a optar por um livro de capa dura e com toda a qualidade de folhas e impressão que esta saga merece. Em seguida é fácil admirar a qualidade gráfica da banda desenhada. Em cada página o detalhe é elevado a um nível que poucas bandas desenhadas conseguem atingir, e nota-se como a mistura de Disney e Marvel confirma esse selo de qualidade. Em cada desenho existe algo que nos transporta para este universo. Os desenhos estão fantásticos, os cenários e os detalhes estão fielmente recriados dentro do que já conhecemos dos livros ou do que imaginamos ser este universo.

A tudo isto junta-se a história e o desenvolver das personagens. O enredo foca-se principalmente em Luke e na sua busca pelos ensinamentos Jedi, mas também sem nunca perder o contacto com Leia e Solo, levando a que este livro seja bastante abrangente sem baixar o ritmo. 

Coerente e inteligente, este foi um livro que adorei ler e que recomendo a todos os fãs de Star Wars. A evolução de Luke é o foco, para percebermos como sem ajuda foi conseguindo evoluir nas suas capacidades jedi, mas também temos o lado interessante de ver a evolução da relação entre Solo e Leia e os acontecimentos que levaram a que Han Solo não conseguisse voltar a Tattoine para pagar a dívida a Jabba. É verdade que no global não consegue ter o impacto que teve o livro anterior, por lhe faltar uma revelação tão forte, mas continua a ser bastante bom.

Tudo o resto que vos posso dizer seria apenas para revelar algo que não devo. Nos próximos dias nova opinião a uma banda desenhada de Star Wars, e acreditem que é mais uma que vai valer a pena. Recomendado!

Luís Pinto

quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

O AMOR NOS TEMPOS DE CÓLERA




Espaço Leitor


Hoje tenho o prazer de trazer mais um texto da Margarida Contreiras que já várias vezes nos enviou as suas opiniões sobre livros que vai lendo.


Autor: Gabriel García Márquez




Sinopse: Um livro para toda a vida.Prémio Nobel da Literatura 1982. A estória de amor vivida por Florentino Ariza e Firmina Daza é contada com toda magia do realismo fantástico de Gabriel. É um livro envolvente, que cativa o leitor do começo ao fim e que acaba torcendo pelo final feliz. As reflexoes sobre a vida, o amor e a morte, temas constantes em García Márquez, sao explorados de forma maestral neste livro. Um livro para toda vida!



Florentino e Firmina são os peões desta história de amor presumivelmente passada na Colômbia oitocentista e definitivamente em tempos de cólera.

A história começa com o remate final de uma declaração de amor que quebra a ação, rebobinando-a num flashback de cinquenta anos que vai progredindo até apanhar o momento inicial. Os amantes, quando jovens, são separados pela família, como manda a tradição, e, ao crescerem, pelo amor unidirecional. Surge um terceiro vértice, que cria o triângulo e toda a frustração de Florentino, que tenta, também ele, criar os seus vértices temporários e insatisfeitos. Firmina, indecisa e insegura, delicia-se numa ascensão social em pompa e circunstância que constantemente se sugere ser teatral ou efémera. Entretanto, o leitor vai tentando resolver se está a ler sobre o amor de Florentino por Firmina ou de Florentino e Firmina. 

Há uma certa previsibilidade neste enredo convencional, o que não leva o leitor a abandonar o livro, mas, antes pelo contrário, dá-nos vontade de o querer saborear no presente sem a pressa de querer chegar ao fim. O seu sonante título concretiza-se apenas na primeira parte, já que este amor se passou em tempos de cólera como se poderia ter passado em tempos de qualquer outra epidemia. A cólera e os seus efeitos colaterais servem mais como referência cronológica do que como motor de ação ou impedimento de um caso amoroso, como poderia sugerir o nome do livro. No entanto, a cronologia tem pouco vulto para a história e pouco peso na narração, como atestam as escassas referências espácio-temporais. Com efeito, o espaço e o tempo são pouco explorados, o que dificulta o encaixe da história na encenação imaginária do leitor. Por outro lado, isso enfoca-o na problemática emocional do enredo. 

Um dos temas abordados é a nostalgia, já que as emoções da personagem central estão constantemente condicionadas por locais, cheiros e cores do passado. O próprio livro reflete isso, ao ser composto por um grande flashback. Esta expressão nostálgica remete o leitor para um passado marcadamente remoto, marca dos velhos tempos empoeirados, reforçada pela escassez de diálogos, que nos dá a impressão de folhearmos um velho álbum de fotografias monocromáticas com olhares profundos. 

Evidentemente, o grande tema desta história é o amor ou, mais especificamente, um caminho para o amor não correspondido mas eterno. O leitor sente a angústia de Florentino enquanto ser não amado, quase literalmente abandonado, e desespera por ele, desespera pela sua obsessão semelhante a uma doença em estado terminal interminável. Contudo, as expressões da personagem são muito mais impassíveis do que se poderia esperar, sendo precisamente as suas ações e as consequências delas que nos levam tantas vezes a sentir pena dele. 

O compasso arrítmico da história parece um pouco desajustado. O autor não se apressa em desenvolver a narração pois, mesmo em alturas de maior suspense, como é a reta final da história, introduz um assunto que vem a propósito mas que não acrescenta nada ao enredo, dando-nos a sensação de estarmos a ouvir alguém apenas por boa educação como preço a pagar para ler um livro de qualidade. Por outro lado, em alguns assuntos de desfecho ou causadores de um ponto de viragem, demora-se tão pouco tempo que o leitor só lhes dá a importância devida nos acontecimentos futuros por eles causados ou não lhe dá importância nenhuma e não entende a origem de certas novas atitudes.

A história e a narração são realmente pouco cativantes mas a expressão escrita é tão apelativa que poderá, por vezes, desfocar o leitor do texto para o fazer constatar “que bela escolha de palavras!”. A escrita é incrivelmente íntegra e acessível, embora esteja longe de se considerar simples. Trata-se de uma espécie de linguagem popular projectada num nível erudito, que resulta num discurso que soa bem. Aliás, é a sua complexidade que o torna tão coeso. Contudo, é necessária alguma atenção aos pronomes para compreender se ainda estamos no sujeito ou no seu primo em segundo grau, arriscando-nos a ter que recuar constantemente algumas linhas para retomar a lógica do discurso. 
A descrição crua da natureza humana, em particular no seu pendor sexual não tem romantismo nem pudor, o sexo é longamente descrito em todos os seus fetiches ou estranhezas que não glorificam a beleza humana mas, ao contrário, a ridicularizam. Não quer isto dizer que as acções do mundo íntimo sejam particularmente importantes na totalidade da história e a prova disso é que o autor conta com o mesmo detalhe o entusiasmante momento do primeiro encontro sexual de Firmina com o seu marido e a lista infindável de leques e plumas que ela trouxe da Europa. Curiosamente, ao contrário do que seria de esperar de todo este realismo, o amor nestas páginas de tempos de cólera, é um amor lavrado mais ao jeito do romantismo: único, arrebatador e perpétuo, mas nunca totalmente extenuante. As personagens não são realistas, apesar da crueza com que a realidade é representada: estas são personagens que recitam “versos de amor contra o vento, chorando de júbilo até amanhecer”.

A qualidade deste livro é indubitável. É claro desde o início que estamos perante um escritor com uma expressão escrita totalmente amadurecida e individualizada de quem domina a sua palavra em todos os ângulos. O enredo não é, contudo, o mais empolgante da história da literatura; são antes as suas personagens contrastantes em si mesmas que nos causam a curiosa emoção de simultaneamente nelas nos perdermos e encontrarmos. Este não é um livro para devoradores de livros inexperientes, é um livro para leitores atentos e pensadores. Não é um livro para apreciar unicamente a estória no seu encadeamento de acontecimentos, é um livro para saborear a escorrência da sua narrativa e a palavra de Gabriel Garcia Marques.


Muito obrigado à Margarida Contreiras por este fantástico texto.




terça-feira, 13 de dezembro de 2016

O ESPIÃO DA SIBÉRIA


Autor: Lionel Davidson






Sinopse: MONTES KOLIMÁ, SIBÉRIA. Enterrada nos gelos eternos esconde-se uma estação científica tão secreta que nem sequer existe oficialmente. Quem lá entra, nunca mais sai. Mas Efraim Rogachev tem um plano.
UNIVERSIDADE DE OXFORD. O pacato professor Lazenby recebe uma mensagem encriptada. O autor é um brilhante cientista soviético desaparecido há décadas sem deixar rasto.
LANGLEY, SEDE DA CIA. Os satélites americanos captam uma explosão num bunker siberiano até ali desconhecido; as imagens são aterradoras.
Nos serviços secretos soam os alarmes. É preciso infiltrar um agente nos Montes Kolimá, um inacessível inferno de glaciares onde a temperatura ronda os 50 ºC negativos. Só um homem parece apto para a missão: Johnny Porter, poliglota, antropólogo, professor universitário e da etnia Gitksan. Os gitksan partilham com os nativos siberianos a mesma língua, a mesma cor de pele, a mesma sobre-humana resistência ao frio. E só um nativo conseguirá atravessar quilómetros de gelo, fintar tribos hostis, chegar ao coração do mistério.



Quando se pensa que o ano já não nos surpreende mais em relação a novos livros, leio esta pérola. Que grande livro!

Como talvez saibam, sou um grande fã de espionagem. Já li vários livros e isso aumenta a exigência que tenho em relação ao género. Este livro situa-se mais ou menos a meio entre os dois extremos da espionagem. Num extremo temos a espionagem pura, muito usada nos livros sobre a guerra fria, onde a acção à base de armas é quase nula e o jogo de bastidores é total. No outro extremos temos James Bond. Posto isto, este livro situa-se mais ou menos a meio, mas mais focado nas táticas de espionagem do que na acção pura. A escrita do autor adapta-se totalmente ao género de livro, demonstrando conhecimento na espionagem e também na forma como molda a narrativa, dando os detalhes no momento certo para que o enredo seja mais fácil de se seguir.

Claro que sendo um enredo de espionagem, terá reviravoltas, mas todas elas são coerentes. Algumas são mais óbvias, outras são surpreendentes. A questão está na coerência que o autor vai mantendo desde o início, dando pequenas pistas, moldando a nossa percepção do enredo e de algumas personagens. A isso juntam-se personagens bem construídas e com várias camadas, tal como se pede num livro de espionagem.

No entanto o ponto forte é novamente a coerência das mesmas, quer nas suas personalidades, atitudes ou mesmo nos diálogos, onde existem várias pistas que um leitor mais desatento poderá não perceber. Destaque para a inteligência de alguns diálogos. O ritmo vai acelerando na proporção certa. A narrativa começa mais lenta, apesar de ter acontecimentos na fase inicial que rapidamente nos agarram ao livro, mas na segunda metade a narrativa acelera para acabar de forma surpreendente.

Outro aspeto positivo está no facto de o autor escrever este livro para qualquer leitor, tanto um veterano na leitura de romances de espionagem, como para alguém que nunca leu. O autor enquadra tudo muito bem, explicar muito do que está a acontecer e faz um bom enquadramento histórico, que torna o enredo mais coerente e ajuda a criar o ambiente sufocante que iremos sentir na fase final. E assim, aos poucos, começamos a entrar na pele dos personagens principais e a sentir a pressão. São vários os momentos em que sentimos que o final não vai ser risonho, e é com essa ideia que a leitura avança, enquanto começamos a sentir que estamos a ser enganados.

Quando acabei este livro ficou a sensação que li um excelente thriller. A história está criada e desenvolvida com inteligência e tudo bate certo. Este livro foi uma verdadeira surpresa e entra, claramente, para a lista dos melhores do ano. Se procuram um bom thriller bastante focado em espionagem, esta é a escolha certa para este Natal. Totalmente recomendado!

Luís Pinto

segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

A GUERRA SECRETA


Autor: Max Hastings

Título original: The secret war



Sinopse: Os espiões e as mensagens em código tiveram um papel crucial na Segunda Guerra Mundial, sendo explorados por todas as nações envolvidas no conflito, para tentar obter conhecimento privilegiado dos inimigos e gerar o caos nos bastidores. Em Secret War, o conhecido jornalista e historiador Sir Max Hastings apresenta um conjunto vasto de personagens fundamentais da Segunda Guerra Mundial, de praticamente todos os países envolvidos, bem como das sagas de informação, resistência e ataque em que se envolveram, com isso revelando uma nova perspetiva sobre o maior conflito da História.



Este é o segundo livro que leio do autor Sir Max Hastings e novamente adorei o livro. Tal como no primeiro livro, também este me ensinou imenso mesmo tendo em conta que já tinha lido muito sobre este tema. 

Este livro foca-se totalmente na espionagem e contra-espionagem durante a segunda guerra mundial, dando uma visão do que foi feito nas sombras, com vários serviços de inteligência a lutarem pelo poder da informação. Com a encriptação de dados e transmissões a ganharem um grande relevo (quem conhecer a história de Turing pode imaginar do que falo), este torna-se num livro essencial para percebermos melhor muito do que aconteceu. Aliás, o autor faz um excelente trabalho em mostrar-nos os resultados de algumas missões e o quando elas influenciaram decisões, movimentações, políticas ou militares.

Com uma escrita que nos ensina regularmente, este foi um livro grande, mas no qual não me senti perdido. O ritmo é lento, pedindo ao leitor para perceber tudo o que está a ser explorado. No entanto, devido ao seu foco na parte da espionagem, esta não é uma leitura que todos possam gostar. No meu caso, sendo um tema sobre o qual gosto muito de ler, esta foi uma leitura muito interessante. 

Gostei da forma como o autor explorou como os espiões atuavam, quais os seus objetivos, o quanto se infiltraram em comunidades e pequenas guerrilhas, e o quanto uma informação errada deu em resultados catastróficos. Pelo meio o autor apresentou uma escrita direta e forte, que nos leva a sentir o desespero e o ambiente pesado daquela época. 

Esta foi uma época de mudança na espionagem. A chegada do "computador" foi a viragem numa altura em que qualquer informação poderia definir a vida ou a morte de vários soldados. No final, foi a espionagem um dos aspetos mais importantes para a vitória dos aliados. Se quiserem ter uma imagem mais coesa do muito que se fez nos bastidores desta guerra, este é o livro a ler. Muito bom!

Luís Pinto

sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

Passatempo: Os espiões do Papa


PASSATEMPO

Os espiões do Papa



Em parceria com a Editorial Presença, temos mais um passatempo de Natal.
Deste vez irmos oferecer um exemplar do livro: Os espiões do Papa, que já analisei no blog.

Obrigado à Editorial Presença por mais este passatempo!

Para se habilitarem a ganhar, basta preencherem o formulário e responderem a uma pergunta.

Apenas é permitida uma participação por pessoa.

O passatempo termina dia 16 de dezembro

Boa sorte a todos!



Sinopse: A suposta impassividade do Vaticano perante as atrocidades dos nazis na Segunda Guerra Mundial continua a representar uma das maiores controvérsias da atualidade. A história apelidou Pio XII de «O Papa de Hitler» e considerou-o conivente com a política e ideologia nazi. Contudo, mais do que manter-se distanciado ou cúmplice dos acontecimentos ocorridos num dos períodos da história mais negros, o Papa teve um papel fundamental nos eventos que levaram à derrota nazi.
O historiador Mark Riebling, baseado em documentos recentemente abertos pelos arquivos secretos do Vaticano e pelo British Foreing Office, apresenta a versão que ao longo de décadas foi encoberta, abrindo as portas do Vaticano para revelar factos surpreendentes na história do pontificado.
Os Espiões do Papa lê-se como um romance policial baseado na figura do espião alemão Josef Müller, embora seja um relato histórico rigoroso. Mais uma obra magistral na coleção Biblioteca do Século, que vem contribuir para uma nova visão da história. 



JARDINS DA LUA


Autor: Steven Erikson

Título original: Gardens of the Moon




Sinopse: Quebrado pela guerra, o vasto império Malazano ferve de descontentamento. Os Queimadores de Pontes do Sargento Whiskeyjack e Tattersail, a feiticeira sobrevivente, nada mais desejam do que chorar os mortos do cerco de Pale. Mas Darujhistan, a última das Cidades Livres, ainda resiste perante a ambição sem limites da Imperatriz Laseen.
Todavia, parece que o Império não está sozinho neste grande jogo. Sinistras forças das trevas estão a ser reunidas à medida que os próprios deuses se preparam para entrar na contenda…
Concebido e escrito a uma escala panorâmica, Jardins da Lua é uma fantasia épica da mais elevada qualidade, uma aventura cativante da autoria de uma excecional nova voz.



Para aqueles que não sabem, este é o primeiro de uma saga de dez livros. 
Para aqueles que não sabem, esta saga é considerada, de forma quase unânime, uma das melhores sagas de fantasia de sempre.
Para aqueles que não sabem, este é considerado por todos como o livro mais fraco dos dez.
E para aqueles que não sabem, fiquem a saber, este livro é muito bom...

Vamos começar pelo óbvio: querem um bom livro de fantasia para este natal? A escolha é este. É difícil, sem revelar nada, conseguir identificar os pontos altos deste livro, até porque são vários mas todos eles ligados diretamente à história. Começando pelo mundo, Erikson criou um universo bastante coerente e vasto. Apesar de só estarmos no primeiro livro, facilmente se percebe que o universo é vasto, cheio de História e com personagens que encaixam muito bem neste mundo. Flora e fauna são explorados de forma suave, mas sublime em alguns momentos, tornando este mundo credível. 

Outro grande aspeto está ligado ao passado deste mundo e destas personagens. Existe uma história anterior que molda de forma inteligente o que está a acontecer nestas páginas, demonstrando em vários momentos que o autor sabe o que está a fazer e sabe para onde vai. Aos poucos o enredo torna-se coerente e a ligação com os personagens é criada com facilidade. Por outro lado as dúvidas aumentam mas o autor não nos dá todas as respostas de imediato, apenas as que nos levam a querer ler ainda mais.

Destaque também para as raças criadas. Gostei da forma como o autor sustentou as raças, com as suas magias, costumes, traumas e objetivos. Tudo faz sentido neste primeiro livro apesar das muitas dúvidas que ficam no ar. O enredo está muito bem conseguido e a narrativa é um ponto alto pela forma como "salta" mas também pela suavidade com que toca alguns temas bem reais num mundo de fantasia. pelo meio, personagens carismáticas, bons momentos de ação e diálogos que nos dizem sempre algo. 

O resultado final é um livro onde tudo parece encaixar bem. Nota-se claramente que o enredo está apenas a aquecer e também se percebe que há muito que não sabemos (algo que se torna óbvio quando sabemos que ainda faltam 9 livros). Li este livro à velocidade da luz mas sempre com o espírito crítico necessário para parar e perceber se o que estava a ler fazia sentido ou era forçado. Agora que já o li, não quero falar sobre o enredo para não vos estragar a surpresa. O que posso dizer é que este é um livro muito bom, e se é considerado, de forma unânime, o mais fraco de toda a saga, então de certeza que irei ler os próximos assim que possível.

Depois destas páginas é fácil perceber o porque de Erikson estar ao lado dos grandes nomes da fantasia, como Sanderson, George Martin, Tolkien ou Feist. Totalmente recomendado e só espero que os próximos não demorem muito a chegar.

Luís Pinto

quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Passatempo: As receitas de Natal do Jamie Oliver - Vencedor!


PASSATEMPO

As receitas de Natal do Jamie Oliver

Vencedor!



Acabou mais um passatempo. Em primeiro lugar, agradeço à Porto Editora por esta oportunidade e em segundo, agradeço a todos os que participaram e deram visibilidade a este passatempo. 

Aos que não ganharam, espero que participem nos próximos passatempos que terei até ao Natal. Boa sorte a todos!

O vencedor é:

Maria Alice Santos

Parabéns à vencedora!

FELIZ NATAL

terça-feira, 6 de dezembro de 2016

A MEMÓRIA DA CHUVA


Autor: Sandra Freitas




Sinopse: Pode o tempo mudar um amor destinado a existir e a perdurar? Pode um amor antigo sobreviver ao presente e à doença?Inês e Jorge viveram, na sua juventude, um namoro idílico, invejado e admirado por muitos, amando-se profundamente. Quando o destino se encarrega de os separar, por circunstâncias indesejadas e mal interpretadas, Jorge parte em busca da realização das suas ambições, tornando-se num respeitado e conceituado cirurgião cardiotorácico. Inês fica onde sempre esteve, revelando-se uma profissional dedicada e mãe extremosa, demasiado ligada a tudo o que não seja ela própria.Doze anos depois, tudo muda. Jorge regressa, precipitando Inês numa espiral de emoções contraditórias, à medida que ambos reavivam sentimentos e revoltas antigas. No entanto, agora existe Sofia, uma menina perfeita e dócil que encanta e confunde Jorge desde o primeiro momento e que Inês resguarda com o velo de uma mãe impetuosa.É neste contexto que Inês descobre que está gravemente doente, com um cancro da mama. E, ao mesmo tempo que luta entre um amor que nasceu para ser eterno e um conjunto de dúvidas e amarguras que a perseguem desde há muito tempo, começa a lutar também pela sua sobrevivência, descobrindo que a vida nos pode trazer muito sofrimento mas também algumas surpresas



Este primeiro livro da autora Sandra Freitas é um misto de sentimentos. Por um lado tem bons momentos que tornam esta obra em algo bom, noutros momentos parece afundar-se um poucos. Mas vamos por partes. O ponto mais negativo do livro é, provavelmente, a existência de alguns erros ortográficos. Já tive como trabalho fazer correções e sei que não é fácil, mas é sempre pena quando aparecem num livro. Pondo de lado esta situação, olhemos para o enredo. O livro parece bastante grande, talvez demais para um romance, mas a história flui com facilidade. O ritmo está bem conseguido e os capítulos estão divididos nos momentos certos para que fique sempre a vontade de continuar a ler.

Sendo um puro romance, a autora consegue criar uma narrativa interessante e que resulta numa boa mistura entre a o romance em si e as vidas profissionais dos personagens, dando um equilíbrio que harmoniza o livro e o torna mais coerente. Infelizmente senti que o livro não sai da sua zona de conforto em termos de espaço, não existindo aqueles detalhes que gostamos de ver num livro passado em Portugal. As referência aos locais onde o enredo se passa não nos ajudam a identificar aqueles locais que conhecemos das nossas cidades. Este aspeto em nada retira qualidade ao livro, mas gostava que tivesse sido melhor explorado.    

Voltando ao romance, estamos perante um livro que tenta ganhar a sua identidade, mas que está preso a certos clichés dos quais é difícil fugir. Aliás, muitos autores famosos nem o tentam fazer. Aqui a autora consegue embalar a narrativa de forma a que tenhamos de imediato ligação com algumas personagens. Claro que algumas reviravoltas foram  previsíveis, mas também é verdade que apesar de óbvias, foram coerentes com o passado e personalidades das personagens. 

O final é arriscado, com um objetivo claro que acredito que a autora consegue atingir. No global este não é um livro que nos marque, mas é uma leitura fácil e interessante para quem gostar do género. É uma narrativa com falhas mas a construção das personagens e o detalhe das suas vidas profissionais leva a que os pontos mais fracos sejam atenuados. Não é um livro fantástico, mas é uma interessante estreia de uma autora que criou aqui um enredo com profundidade e consistência.

Luís Pinto

segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

OS ESPIÕES DO PAPA


Autor: Mark Riebling

Título original: Church of spies




Sinopse: A suposta impassividade do Vaticano perante as atrocidades dos nazis na Segunda Guerra Mundial continua a representar uma das maiores controvérsias da atualidade. A história apelidou Pio XII de «O Papa de Hitler» e considerou-o conivente com a política e ideologia nazi. Contudo, mais do que manter-se distanciado ou cúmplice dos acontecimentos ocorridos num dos períodos da história mais negros, o Papa teve um papel fundamental nos eventos que levaram à derrota nazi.
O historiador Mark Riebling, baseado em documentos recentemente abertos pelos arquivos secretos do Vaticano e pelo British Foreing Office, apresenta a versão que ao longo de décadas foi encoberta, abrindo as portas do Vaticano para revelar factos surpreendentes na história do pontificado.
Os Espiões do Papa lê-se como um romance policial baseado na figura do espião alemão Josef Müller, embora seja um relato histórico rigoroso. Mais uma obra magistral na coleção Biblioteca do Século, que vem contribuir para uma nova visão da história.



Aqui está a mistura de dois temas que gosto bastante de ler: espionagem e Segunda Guerra Mundial. Assim que vi este livro nas prateleiras das livrarias decidi que tinha de o ler. Depois de ter lido vários livros sobre a WWII, sempre me questionei sobre o papel delicado que o Vaticano teve durante aqueles anos. Agora posso ler um pouco mais, porque não estamos perante um simples romance, mas sim um forte trabalho de investigação. E é com base nesta investigação que o livro ganha qualidade. 

Claro que este é um romance, um thriller, com muitas personagens fictícias nos papeis principais. No entanto, o enredo, bom e cheio de suspense, não é o ponto forte do livro. Mas já lá vamos. Olhando para o enredo, é fácil começar a ler a grande velocidade. O ritmo é elevado e o mistério adensa-se rapidamente, ao ponto de na fase inicial do livro já estarmos totalmente dentro da trama. Claro que para isso muito ajuda o conhecimento que o leitor pode ter do tema. No entanto, quem não seja grande conhecedor de alguns factos históricos acabará por receber essa informação do próprio livro. Como disse antes, a investigação histórica está muito bem conseguida, com o autor a misturar ficção e realidade com mestria e ensinando constantemente o leitor. 

Gostei de algumas surpresas e reviravoltas, e também apreciei algumas personagens que me surpreenderam com algumas decisões que mais tarde se tornaram coerentes. Todavia, na parte do enredo o trunfo está na mistura de espionagem e política que é este jogo que alguns personagens tentam jogar, mas que nem todos conseguem. Mas, tal como já disse, o trunfo deste livro não é o enredo em si, mas antes a investigação feita pelo autor e que é a base do próprio enredo.

Com uma narrativa inteligente na cadência com que no dá factos históricos e os mistura com as revelações da ficção, este é um livro que se lê de forma compulsiva se gostarem do estilo e do tema. Se olharem para este livro e vos despertar a atenção pela sua base, então acredita que vale mesmo muito a pena ler. Recomendado.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

AS PRIMEIRAS QUINZE VIDAS DE HARRY AUGUST


Autor: Claire North

Título original: The First Fifteen Lives of Harry August 




Sinopse: Harry August não é um homem normal. Porque os homens normais, quando a morte chega, não regressam novamente ao dia em que nasceram, para voltarem a viver a mesma vida mas mantendo todo o conhecimento das vidas anteriores. Não interessa que feitos alcança, decisões toma ou erros comete, Harry já sabe que quando morrer irá tudo voltar ao início. Mas se este acumular de experiências e conhecimento podem fazer dele um quase semideus, algo continua a atormentar Harry: qual a origem do seu dom e será que há mais pessoas como ele?
A resposta para ambas as perguntas parece chegar aquando da sua décima primeira morte, com a visita de uma menina que lhe traz uma mensagem: o fim do mundo aproxima-se.
Esta é a história do que Harry faz a seguir, do que fez anteriormente, e ainda de como tenta salvar um passado que não consegue mudar e um futuro que não pode deixar que aconteça.



Será que posso fazer uma análise a dizer "Recomendado" e nada mais? Neste livro é o que apetece... dizer a alguém para o ler, sem ideias, sem expectativas... mas como devo fazer uma análise ligeiramente mais aprofundada do que com apenas uma palavra, aqui vou eu, tentar explicar-vos o porquê de este ser um dos livros do ano...

Imaginem que podem repetir a vossa vida, sabendo o que vai acontecer. Decidem tomar decisões diferentes? O que mudam? O que muda sem que vocês queiram? Qual é sequer o objetivo de mudar algo durante a vossa vida se depois a vão repetir? o que ganham e o que perdem...?

A primeira metade do livro demonstra a inteligência da autora e serve como fase de adaptação do leitor a um livro que vai dando saltos de forma a que seja possível ver as quinze vidas do personagem principal. Harry August foi um personagem que fui apreciando aos poucos. No início não tive qualquer ligação com ele e muito se deve ao facto de estar perante uma personalidade totalmente moldada pelo peso que suporta. As dúvidas, os medos... a tristeza de ver que uma pessoa que o adorava numa vida, noutra nem o conhece. O peso de sentir os efeitos das suas escolhas, a capacidade de ver o quanto uma pequena escolha pode fazer tão grande diferença. A noção de quando irá morrer, e de quando as pessoas que gosta irão morrer...

Depois chega a segunda metade do livro. A trama está lançada e atinge um novo patamar. As dúvidas de Harry são as nossas dúvidas e a cada página questionamos o que faríamos nós naquele instante. Mas, acima de tudo, quando fechamos o livro, pensamos sobre o que faríamos se tivéssemos tal poder. O que vale a pena ser mudado? Algo apenas nosso? Ou devemos melhorar o mundo? Para quem volta sempre a viver, qual é o risco de morrer? Até que ponto a morte condiciona cada minuto da nossa vida? Ou ainda mais importante...  de que vale a pena fazer algo bom, se depois tudo começa do zero? 

E é com todas essas perguntas que nos imaginamos naquela situação, a melhorar a vida de quem amamos porque sabemos o que temos de fazer. E reviver, decidir e sentir que o poder é demasiado para alguém ter. E é tudo isso que este livro tem. Ao início parece um bom livro com uma base original, no fim é algo que fica connosco e que nos faz questionar algumas decisões, o que teria sido diferente.

Este é um livro único. É algo que sai das páginas e nos agarra, transportando-nos para um outro mundo onde a nossa mente está presa ao que um autor escreveu. Sentimos algo com as palavras de uma autora que não conhecemos. Sabemos que nada daquilo é real, vivemos aqueles momentos como se fossem. É isto que um livro deve ser. Claro que este também é um livro com falhas, com momentos forçados ou menos coerentes, e, no final, não é uma obra prima... mas está perto. E é, claramente, um dos melhores livros que li este ano. Totalmente recomendado.

Luís Pinto