ESPAÇO LEITOR
Hoje regressamos ao Espaço Leitor com mais uma opinião da Margarida Contreiras a quem agradeço imenso este texto. A todos os restantes leitores que também já enviaram textos com as suas opiniões, lamento o atraso, mas irei publicá-las aos poucos.
Autor: Juliet Marillier
Sinopse: Depois da série Sevenwaters, com a qual recebeu vários prémios internacionais, Marillier recua agora ao tempo dos viquingues. Eyvind sempre desejou ser um grande guerreiro viquingue — um Pele-de-Lobo — mas o seu amigo de infância Somerled tem outros planos para o futuro. Apesar do juramento que fizeram quando crianças, Eyvind e Somerled acabam por seguir caminhos diferentes: o primeiro transforma-se num feroz servidor de Thor e o outro um cortesão erudito. Mas o destino acabará por reuni-los em circunstâncias misteriosas...
O Filho de Thor é um romance épico passado no tempo dos viquingues exploradores de mares e salteadores de tesouros que nos transporta até ao arquipélago das Ilhas Brilhantes, ao largo da costa meridional da Escócia, que dão o nome a esta saga. Aqui, Juliet Mariller conta-nos a história do jovem escandinavo Eyvind que ambiciona ser um guerreiro do deus Thor – um pele de lobo, como eram conhecidos os destemidos que combatiam num transe de fúria que os tornava na verdadeira imagem do invencível: no campo de batalha, os seus machados obedeciam apenas à voz do deus da guerra e não conheciam clemência para além daquela que lhes permitisse o seu senhor.
Porém, o desembarque nas Ilhas Brilhantes e o encontro com as tradições pacifistas dos nativos explode num desigual conflito entre as ambições do seu irmão de sangue e o conhecimento antigo do povo nativo, levando Eyvind a rever as irrevogáveis premissas do deus da guerra. Perdido na desonra entre a traição mística e os braços de uma sacerdotisa, o herói procura uma nova força em prol de um novo sentido de justiça, que não encontrará sem os mais penosos sacrifícios. Esta história leva-nos à encruzilhada que se atravessa no caminho do pele de lobo, às dolorosas escolhas a que se vê obrigado e às proezas que o conduzem na procura de um triunfo justo e misericordioso.
Não se trata propriamente de um romance moralista que incite ao pensamento sobre a dimensão humana. Trata-se antes de uma narrativa heróica sobre a fatídica luta do bem contra o mal, que nos convida a viver as impactantes emoções de perda, frustração, vitória, justiça e paixão. Sem destaque para nenhuma personagem, o homem forte e sensível, a mulher frágil e poderosa, o chefe escrupuloso e justo, o vilão cruel e implacável, a que se juntam os fiéis amigos e a velha sábia, compõem os habituais ingredientes de uma conturbada aventura que nos transporta para as tradicionais sagas medievais dos Norsemen.
Os nativos das Ilhas Brilhantes, a que a autora se refere como os folk, terão sido, presumivelmente, os pictos, que sofreram, na verdade, a brutalidade das invasões escandinavas, o que dá uma base real a esta aventura, tornando-a também num romance histórico bem temperado de fantasia. O mundo dos folk é um dos encantos desta história, em que pedra, osso e folha falam connosco através dos personagens. Entre sangue e profecia, surgem mulheres do mar e harpas encantadas que embevecem o leitor, maravilhando-o e compensando-o também pela chacina impiedosa infligida pelos viquingues invasores, cuja cultura é abordada apenas ao de leve a favor do tema da brutalidade guerreira que aqui é bastante ilustrada.
A narrativa é bastante empolgante ao longo de todo o livro, quer pela emoção das batalhas, quer pelas apelativas tradições, ou pela fatal atracção entre o herói e a heroína. Não é, contudo, um encontro ao inesperado, pese embora o suspense que subtilmente se sente na escrita. Pelo contrário, o desfecho das várias etapas é bastante previsível, talvez porque as próprias personagens, sendo elas redondamente boas ou redondamente más, têm os destinos redondamente justos que já visitámos noutras histórias. Não leva isto, contudo, a que este seja um mau livro. Para mim, o que define a qualidade é, não só o que se conta, mas também como se conta e, neste caso, O Filho de Thor faz bastante jus a uma tipologia literária tradicional que embala o leitor numa teia de emoções fortes para, no voltar da última página, encontrar a satisfação de um final reconfortante, mesmo que pouco surpreendedor.
Uma vez mais, obrigado à Margarida Contreiras por esta opinião!